Thursday, December 21, 2006

Capa
Dedicatória

Aos que amam, aos que não amam
e aos que não fazem a menor idéia do que lhes está acontecendo...
Apresentação

Estes contos, se são meio amorosos, é porque, tenho certeza, não há mesmo muita certeza sobre o amor.
Ainda que impossível, como evitá-lo?... Mas, sinceramente, já que existe (e é, às vezes, tão bom...), por que tentar evitá-lo?...
De tal modo invade, que, de vez em quando, há que botá-lo para fora. Ou (a maioria prefere...), dependendo da hora, trazê-lo para dentro...
Alguns o escorraçam (ele volta, cachorrinho, tomando conta...). Outros, o agarram, se agarram a ele (que, felino, salta no ar...).
Eu, que não entendo o amor (como a maioria...), que tenho quando não quero e quero quando não tenho, tento administrar: mantenho a pose, mando recado, busco contato, escrevo qualquer coisa...
Daí, esses contos.
Registro

O conto Nas Pontas do Casco foi premiado em 5o. lugar (entre 900),
no XVI Concurso Nacional de Contos José Cândido de Carvalho,
promovido pela Prefeitura Municipal de Campos dos Goytacazes, RJ,
através da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, Dez/2006.
Epígrafe

O amor, já de si, é algum arrependimento.
(João Guimarães Rosa, Grande Sertão: Veredas, pg. 41).
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Amor é desengano.
No entanto, vive me enganando...
(Eu mesmo, qualquer hora).
Nas Pontas do Casco

As pontas, as lascas do vidro, o brilho nas pontas. O sorriso marrom da garrafa quebrada. A proximidade do pescoço. As estrias das lâminas da garrafa na pontaria da veia. O serrilhado do vidro na expectativa do corte. A jugular latente sob a pele pálida.
Detalhe da garrafa no primeiro plano, fundo desfocado, ponto de vista superior, acima e atrás da câmera. Câmera lenta.
A garrafa quebrada de cerveja. O marrom das pontas no pescoço. Entre o gargalo e o pescoço o bojo, as pontas da garrafa. As lascas, as lâminas de vidro. O brilho dos cacos. A mão firme no gargalo, o medo líquido nos olhos. O corpo empurrado contra a parede, a mão agarrando a camisa. Agitação nas mãos, tremores nas faces. Os frêmitos. Mútuos...
Flash!... Imagem congelada, o flagrante. Gesto no ar. Expressões angustiadas.
A vida suspensa na realidade da cena...
Rebobinar a fita. De volta ao início da cena... Externa. Agitação na rua... Ponto zero. Dar o play.
Saída intempestiva, ânimos exaltados, raivas que se espalham pela calçada. Cada um fala, e pára, e gira, e anda, e volta, e grita e agita. E tudo recomeça, o tempo todo. Entre tantos, que se confundem, os dois. Encontram-se os dois. Que se empurram, discutem, xingam, põem tudo pra fora. Da boca pra fora...
Foto confusa. Grupo na calçada. Imagem desorganizada, gestos desconexos. No meio, um avança, dedo em riste. Outro recua, passo leve.
Os dois no centro da roda. Entreveros, recontros. Empurra-empurra, desequilíbrios. A chegada ao bar. As duas portas, os portais de pedra. O balcão do cafezinho junto à rua, a fórmica lisa, o tampo de alumínio. Amontoam-se, apertam-se entre o balcão e a coluna da porta. A pedra lavrada, cantaria. O silêncio perdido do fraco movimento da tarde. O dono por dentro do balcão, o empregado ao fundo, o cliente que sai do banheiro fechando a braguilha. Adentram os que discutem, os que se empurram. A dança convulsa invadindo o salão.
Câmara de mão. Acompanhar a entrada do grupo, zoom fechando em movimentos bruscos. Do plano geral ao americano, do grupo principal aos figurantes do fundo. E vice-versa.
À força de mil razões, o de cabelos brancos empurra o ainda verde sobre o pano surrado do bilhar. O corpo se encolhe no feltro da mesa. Um bote se arma no ataque do outro. A sinuca é de bico.
Gustavo sabe bem que foto faria...
Posicionamento lateral à mesa. Grande grande-angular, 20mm. Enquadrar o corpo na horizontal. No canto, o perfil do outro. Luz ambiente. Abrir meio ponto.
A jogada é inspirada. A bola é a da vez, a vermelha. A primeira à mão... Irado, zune, o rapaz, a bola. O alvo nem vê nem desvia: avança!... A bola tira fino da cuca. O jovem, na mão, sente a coisa preta. A bola sete.
Guilherme dirigiria com precisão a tomada...
Quebra de eixo: ponto de vista do interior do bar para fora. Câmara junto à bola, atrás da mão. Câmara acompanha bola em movimento, em close. Fechar o plano no rosto. Fixar a expressão.
Jogada decisiva, pesada. Sem jeito, sem prática, o teco é errado. Sem mira, a bola preta raspa, apenas, o fio da barba branca. Bolado, o alvo toma a garrafa, a cerveja largada na mesa. Na marra, outra bola, a marrom, é lançada. A defesa faz de taco a garrafa. Na metade, tem peso a cerveja... A bola resvala.
Típico instantâneo. A bola resvalando na garrafa, o rebatedor, com a cara assustada, terminando ainda o gesto, o braço estendido daquele que lança. Sombras dramáticas, ação congelada pelo flash.
A presa gira a mão espalmada no pano, procura mais armas... Nada, acha nada... As bolas estão na caçapa. A defesa se abre. O ataque cresce.
Com a esquerda, Gustavo, o mais velho (mais ágil...), agarra a camisa de Guilherme, o mais jovem (mais leve...). Ao avançar, quebra a garrafa na mesinha de mármore. Desperdiçada, a cerveja se espalha. Cacos tilintam no ladrilho barato.
A camisa amarfanhada na mão, a pressão sobre o peito. O olhar assustado do outro...
A vida nas pontas do casco.
Uma mão feminina, suave (mas, firme...), aperta seu pulso.
Juliana apela.
A lâmina curva da garrafa parece que pára...
A jugular ainda pulula...
Há mar...

Ela ondulava entre as mesas e os seres, vazando as ruas entupidas do velho centro do Rio – Rosário, Ouvidor, Arco do Teles – tomadas por hordas de trabalhadores, os financeiros e os comerciais – fim de expediente, véspera do 1º de Maio –, que se despejavam nos bares, se acotovelavam nas mesas, se esfregavam nos cantos. Entre todos, ela seguia, altaneira, à frente dele. Ela, a proa. Ele, apenas o resto do navio...
Atravessava os grupos, driblava as conversas, evitava as portas. Dos bares saltavam vozes das dores de corno, bêbados ocasionais e amantes oportunistas, fora os seguranças (a trabalho, mais mal encarados...), mas, quem se importava?... Corria a maior animação, as bocas trocavam a alegria por goles de cerveja, e ela à frente, fazendo jogo de corpo, mamboleando, ondulada, desejável, apenas seguindo, com um pouco de pressa, seu caminho.
Ele, no vácuo, à bolina... Roçava as mãos nos seus braços, tentava guiá-la (como se precisasse...), tocava com as pontas e palmas das mãos as costelas, a cintura, as espáduas, buscando ampará-la (enquanto conferia-lhe as formas...), falando ao pé do ouvido para alertá-la dos riscos da rapidez da caminhada e curtir um cheiro, um roçar no pescoço, um toque na orelha...
Seguia ela, a própria proa. Muito mais: uma figura de proa!... Ele a seguia, bojo de navio. O volume, o peso, a carga... Ela transbordava as ondas. Ele, corpo colado nela, dava-lhe o lastro. Navegavam os dois como um só. Se ela refugava (escolhos à frente!), ele colava mais...
Trânsito intenso, cadeiras, mesas, pessoas, mar revolto. Ele se apertava, sentia o corpo encaixado, o corpo grudado, quase mergulhado nela. A maré subindo, ele ia mais fundo...
Boca da barra, ela foi embora. Não aceitou nem um chope, estava mareada. Ele, incompleto navio sem proa, afundou numa mesa. Ancorado na solidão.
Mas, feliz!
Recolheu dela um rabisco num guardanapo, como se o mundo de um náufrago coubesse no fundo de uma frágil garrafa: o número do telefone!
Ah, há mar...
Contra-capa

Ah, o amor...
Muitas são as formas de amar,
outras tantas (ou mais?...) de desamar.
Estes contos, que apenas arranham a superfície
(as costas, as coxas?...) do amor,
estão aí porque é sempre bom não esquecer que ele existe.
(Ah, e ele deixa?...)

A série Livri... e outras publicações


LIVRI
O livro livre na Internet

(clique com o lado direito do mouse e escolha "abrir nova janela")

1 > Pão de Açúcar Tempo Todo

o primeiro livri, fotos e textos;

2 >
A Paixão Dança

um poema-romance, em fotos e textos;

3
>
Santa Teresa dos Detalhes

um passeio premiado pelo bairro mais charmoso do Rio;
4 > Três Contos de Futebol

incluindo o finalista do Contos do Rio/Prosa & Verso/O Globo, 2006;
5 >
dois contos meio amorosos

incluindo o 5o. lugar no XVI Concurso Nacional de Contos José Cândido de Carvalho, 2006;
6 >
A Ilha de Cabo Quente
com o conto vencedor do Concurso Literário Teixeira e Souza (Cabo Frio-RJ, 2007).
7 > Personagem

a história do projeto de livro, fotos & textos;
8 >
Esses Sexos...
para os que gostam de sexo e também para os que praticam.
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Outras publicações na Internet >

1 > A série A História bem na Foto,
com fotos e depoimentos
de grandes fotojornalistas brasileiros.

2 >
Vida Lida o que leio da vida e o que lêem de mim

3 >
A Foto Histórica
(e suas histórias) no Brasil

Projeto contemplado com o
Prêmio Funarte Marc Ferrez de Fotografia - 2010


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E as publicações em livro:


1 > Apoena e o Caos
apresentando o livro "Apoena – o homem que enxerga longe

2 > Rio de Amores
livro de contos com dois bons e justos motivos:
o amor e o Rio de Janeiro
3 > O Jogo do Resta Um

Romance sócio-antropológico
quase histórico, pouco político,
meio filosófico, muito econômico


 E, a partir de 2013, pela
4 > "2112 ...é o fim!"
O Brasil caindo nos crônicos contos
de um futuro mal passado...    

5 > Rio de Amores (uma versão enxuta de Rio de Amores)
Reminiscências e elucubrações sobre a arte e a prática do fotojornalismo
Conceito Livri

Livri, livro livre na internet, é uma forma de publicação.
Para saber mais sobre o conceito, leia o Editorial Livri, clicando
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Distribuição livri

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